19 de dez. de 2014

NENHUMA VOCAÇÃO MILITAR

Esse deve ter pago muito canguru.
1959. Em uma turma de primeiro ano do Curso de Formação de Oficiais da PMMG, havia um aluno que demonstrava, desde o início do ano, nenhuma afeição ao ambiente militar. Sofria gozações da turma e do próprio irmão mais velho, na mesma turma, e que antes fora sargento, com alguma vivência de caserna, portanto (esse um tanto ríspido e querendo fazer valer a hierarquia familiar do "primogênito").
Correu o ano até as provas finais. Foi quando aflorou toda a ojeriza que nosso colega nutria, em relação á vida militar.
O instrutor de "Instrução Geral", matéria que tratava, especialmente, dos rituais militares, entrou em sala, com as provas em baixo do braço, para dar aquilo que hoje chamamos de "vista de prova". Era vermelho de natureza mas estava muito mais vermelho do que o habitual. Antes de distribuir as provas, observou, nitidamente contrariado:
- Vejam o que este aluno escreveu na prova!
A pergunta era: "Você entra em uma lanchonete (termo aqui atualizado) para fazer um lanche e encontra lá um superior hierárquico. Qual o seu procedimento?"
Leu a resposta:
- "Posso proceder de duas maneiras: primeira, prestar a continência a meu superior, assentar-me a uma mesa e tomar o meu lanche; segunda, prestar a continência a meu superior e retirar-me do recinto, porque a presença do superior me causa náuseas n'alma, me tira o apetite e a alegria de viver".
Não precisa dizer que, no ano seguinte, não pertencia mais à turma. Deve ter sido melhor para ele.

Foto: http://4h20.wordpress.com/2011/03/23/sou-seu-soldado-senhor/

2 comentários:

Unknown disse...

Cada um do seu jeito. Nossa turma do Colégio Militar ainda faz um encontro anual em que alguns de nossos ex-sargentos (agora capitães) são sempre convidados. Obs.: nos formamos em 1978.

marco antônio comini christófaro disse...

Claro! Frequentei quartel durante trinta anos e dei-me muito bem. Mas observei que muitos dos que estão lá são infelizes. Tenho no meu currículo o caso de um soldado que criou vários problemas - na verdade para si mesmo. Certa vez, observei-o apresentando-se a um cabo. Estava com expressão e atitude de como se estivesse preso a um elástico esticado ao máximo. Se alguém cortasse o elástico, protetar-se ia sobre o cabo. Pratiquei e sugeri ações para que fosse excluído disciplinarmente. Foi. Era de se pensar que me odiasse. Algum tempo depois, passei por ele em BH, camelô vendendo limão. Estava limpo, bem barbeado, apresentação boa, que não tinha nos tempos de caserna. Cumprimentou-me com um sorriso franco e jovial. Imaginei que ali, não teria um cabo na vida dele; não teria horários nem lugares: se, de repente cismasse da mão, poderia deixar suas sacolinhas de limão em um restaurante ali perto e ir ver um filme no cine Acaiaca, ali pertinho. Entendi que havia feito bem a ele, trabalhando por sua exclusão (se não é feliz aqui, vá ser em outro lugar, você encontrará). Mais tarde, em reunião de Alto Comando, relatei o fato. Um Coronel realçou, como preferida dele, a referência a "não ter um cabo na vida dele". Entendi, também, que não é pelo fato de eu prezar minha profissão, o próprio ambiente de quartel com todas as suas camaradagens, solidariedade e grosserias (que tem de monte, também), não será pelo fato de me ter dado bem que possa achar de querer transformar o mundo em um quartel.